No mundo dos concursos públicos, existe uma máxima antiga: “o candidato precisa acompanhar o Diário Oficial todos os dias”. Mas até que ponto essa exigência é realmente razoável?
Esse foi o debate enfrentado recentemente em mandado de segurança ajuizado pelo nosso escritório. A candidata havia sido aprovada dentro do número de vagas, mas só foi convocada para nomeação dois anos depois — com publicação feita exclusivamente no Diário Oficial, sem qualquer outra forma de contato. O resultado? Ela perdeu o prazo e só descobriu a nomeação meses depois.
Diante da situação, buscamos o Poder Judiciário — que reconheceu, em decisão liminar, que a convocação feita apenas por Diário Oficial, após longo lapso temporal, viola os princípios da publicidade, razoabilidade e proporcionalidade. A Justiça determinou, assim, que a candidata fosse reconvocada, com novo prazo para apresentação dos documentos.
A convocação tem que ser feita por e-mail, telefone ou WhatsApp?
A legislação brasileira exige que os atos administrativos tenham publicidade. Tradicionalmente, essa publicidade se dá por meio do Diário Oficial. No entanto, quando o tempo entre a inscrição no concurso e a convocação se torna excessivo, essa forma tradicional deixa de ser suficiente para atingir sua finalidade: comunicar, de fato, o candidato.
É o que entendeu o Tribunal de Justiça da Bahia ao julgar o caso:
"Mesmo não havendo previsão expressa no edital do certame de intimação pessoal do candidato quando de sua convocação, em observância aos princípios constitucionais da publicidade e da razoabilidade, a Administração Pública deveria comunicar pessoalmente o candidato sobre a publicação do ato."
(TJ-BA, proc. 8005610-35.2024.8.05.0039)
Ou seja, não se trata de favorecer o candidato, mas sim de garantir que a convocação cumpra sua função: dar ciência da nomeação. Em tempos em que o próprio edital prevê envio de cartões informativos por e-mail, é incoerente que a convocação seja feita apenas por meio de publicação oficial, sem nenhuma tentativa adicional de contato.
O que diz o STJ sobre o assunto?
O Superior Tribunal de Justiça já consolidou o entendimento de que a convocação por Diário Oficial pode ser inválida se feita após longo período sem movimentação no concurso, especialmente quando há expectativa legítima do candidato em ser nomeado.
“É inviável exigir que o candidato acompanhe, diariamente, com leitura atenta, as publicações oficiais.”
(STJ, RMS 34304/ES)
A jurisprudência é clara: convocações tardias exigem comunicação eficaz. Eficácia não é só seguir a forma, mas alcançar o objetivo — nesse caso, fazer o candidato saber que foi convocado.
Conclusão: o bom senso também é regra
O edital deve ser respeitado, mas não é blindado contra o bom senso. Quando a Administração Pública convoca um candidato anos após a realização do concurso e apenas via Diário Oficial, desconsidera a realidade prática e tecnológica dos tempos atuais — além de violar direitos.
Se você passou por situação semelhante, há fundamento jurídico para exigir reconvocação e até reparação. A Justiça tem reconhecido, cada vez mais, que a publicidade precisa ser eficaz, e não apenas formal.